segunda-feira, 16 de setembro de 2013

Projeto Nim

O que acontece quando um chimpanzé é criado como humano?


Em 1973, o chimpanzé Nim foi separado da sua mãe com poucas semanas de idade e levado aos cuidados de outra mãe, uma humana. Nascido no Centro de Pesquisa de Primatas de Oklahoma, o pequeno macaco foi o personagem principal de uma experiência com a intenção de provar que a linguagem dos homens poderia ser aprendida pelo seu parente mais próximo. Parece ficção, mas aconteceu e deu origem ao documentário Project Nim.
Imagens de arquivo descobertas, depoimentos dos envolvidos e cenas recriadas ajudam a contar a história do pequeno primata que foi obrigado a viver com uma família humana. A psicóloga que toma o lugar de sua mãe, chega dar-lhe de mamar no peito e cria o animal juntamente com seus filhos. No entanto, a família humana falha em ensinar-lhe linguagem e sofre quando o bicho começa a comportar-se como um animal selvagem, mordendo e comportando-se de forma violência. 
O chimpanzé passa pelos cuidados de outras estudantes de psicologia que tentam ensinar -lhe os sinais de comunicação até que uma delas abandona o projeto por ter sido mordida no rosto por Nim. 
Quando o responsável pela investigação decide acabar com o projeto, Nim foi levado para o centro de pesquisas onde nasceu. Com quase 120 sinais no seu vocabulário, Nim começa a fazer amigos humanos no local e aprende da maneira mais difícil a conviver com outros chimpanzés. Bebe cerveja e fuma, como os homens. 
Pouco tempo depois, sem recursos, o Centro de Primatas é obrigado a fechar as portas e Nim é vendido para pesquisas médicas e acaba dentro de um laboratório numa gaiola menor ainda onde é submetido a experiências médicas muito traumáticas. Os seus amigos humanos descobrem a situação e lutam para que seja solto. Um ativista dos direitos dos animais acaba por comprar Nim,  levando-o primata para o seu centro de acolhimento de animais maltratados no Texas. Lá, mais uma vez, o animal fica sem a companhia de outros indivíduos da sua espécie e de humanos que soubessem os sinais de comunicação que tinha aprendido.
O filme conta a história da passagem de Nim pelo mundo dos humanos pela voz das próprias pessoas que conviveram com ele. Nas palavras do realizadoror James Marsh, é uma biografia de um animal baseada no livro "Nim Chimpsky: O chimpanzé que seria humano", de Elizabeth Hess. 
Revista Galileu - Consultado no dia 16/09/2013 / Texto adaptado

quinta-feira, 12 de setembro de 2013

O que é uma Pessoa?


É possível dar à expressão "ser humano" um significado preciso. Podemos usá-la como equivalente a "membro da espécie Homo sapiens". A questão de saber se um ser pertence a determinada espécie pode ser cientificamente determinada por meio de um estudo da natureza dos cromossomas das células dos organismos vivos. Neste sentido, não há dúvida que, desde os primeiros momentos da sua existência, um embrião concebido a partir de esperma e óvulo humanos é um ser humano; e o mesmo é verdade do ser humano com a mais profunda e irreparável deficiência mental — até mesmo de um bebé anencefálico (literalmente sem cérebro).
Há outra definição do termo "humano", proposta por Joseph Fletcher, teólogo protestante e autor prolífico de escritos sobre temas éticos. Fletcher compilou uma lista daquilo a que chamou "indicadores de humanidade", que inclui o seguinte:
                    Autoconsciência
                    Autodomínio
                    Sentido do futuro
                    Sentido do passado
                    Capacidade de se relacionar com outros
                    Preocupação pelos outros
                    Comunicação
                    Curiosidade
É este o sentido do termo que temos em mente quando elogiamos alguém dizendo que "é muito humano" ou que tem "qualidades verdadeiramente humanas". Quando dizemos tal coisa não estamos, é claro, a referir-nos ao facto de a pessoa pertencer à espécie Homo sapiens que, como facto biológico, raramente é posto em dúvida; estamos a querer dizer que os seres humanos possuem tipicamente certas qualidades e que a pessoa em causa as possui em elevado grau.
Estes dois sentidos de "ser humano" sobrepõem-se mas não coincidem. O embrião, o feto subsequente, a criança gravemente deficiente mental e até mesmo o recém-nascido, todos são indiscutivelmente membros da espécie Homo sapiens, mas nenhum deles é autoconsciente nem tem um sentido do futuro ou a capacidade de se relacionar com os outros. Logo, a escolha entre os dois sentidos pode ter implicações importantes para a forma como respondemos a perguntas como "Será que o feto é um ser humano?"
Quando escolhemos as palavras que usamos em situações como esta, devemos empregar os termos que permitam exprimir o que queremos dizer com clareza e que não introduzam antecipadamente juízos sobre a resposta a questões substanciais. Estipular que usamos o termo "ser humano", digamos, no primeiro sentido e que, portanto, o feto é um ser humano e o aborto é imoral não ajudaria em nada. Tão-pouco seria melhor escolher o segundo sentido e defender nesta base que o aborto é aceitável. A moral do aborto é uma questão substancial, cuja resposta não pode depender do sentido que estipularmos para as palavras que usamos. Para evitar fazer petições de princípio e para tornar o meu sentido claro, porei de lado, por agora, o ambíguo termo "ser humano" e substitui-lo-ei por dois termos diferentes, correspondentes aos dois sentidos diferentes de "ser humano". 
Para o primeiro sentido, o biológico, usarei simplesmente a expressão extensa mas precisa "membro da espécie Homo sapiens", enquanto para o segundo sentido usarei o termo "pessoa".
Este uso da palavra "pessoa" é, ele mesmo, infeliz, susceptível de criar confusões, dado que a palavra "pessoa" é muitas vezes usada como sinónimo de "ser humano". No entanto, os termos não são equivalentes; poderia haver uma pessoa que não fosse membro da nossa espécie. Também poderia haver membros da nossa espécie que não fossem pessoas
A palavra "pessoa" tem a sua origem no termo latino para uma máscara usada por um actor no teatro clássico. Ao porém máscaras, os actores pretendiam mostrar que desempenhavam uma personagem. Mais tarde "pessoa" passou a designar aquele que desempenha um papel na vida, que é um agente. De acordo com o Oxford Dictionary, um dos sentidos actuais do termo é "ser autoconsciente ou racional". Este sentido tem precedentes filosóficos irrepreensíveis. John Locke define a pessoa como "um ser inteligente e pensante dotado de razão e reflexão e que pode considerar-se a si mesmo como aquilo que é, a mesma coisa pensante, em diferentes momentos e lugares."
Esta definição aproxima a "pessoa" do sentido que Fletcher deu a "ser humano", com a diferença que escolhe duas características cruciais — a racionalidade e a autoconsciência — para cerne do conceito. É muito possível que Fletcher concordasse que estas duas características são centrais e que as restantes decorrem mais ou menos delas. Em todo o caso, proponho-me usar o termo "pessoa" no sentido de um ser racional e autoconsciente, para captar os elementos do sentido popular de "ser humano" que não são abrangidos pelo termo "membro da espécie Homo sapiens".
Peter Singer
Tradução de Álvaro Augusto Fernandes
Texto retirado de Ética Prática, de Peter Singer (Lisboa: Gradiva, 2000).
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ANÁLISE/EXPLORAÇÃO DO TEXTO
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Questões colocadas no texto:


O que é uma Pessoa?
"Será que o feto é um ser humano?"
Poderia haver uma pessoa que não fosse membro da nossa espécie?
Também poderia haver membros da nossa espécie que não fossem pessoas?



quarta-feira, 11 de setembro de 2013



O Conceito de Identidade Pessoal


Ao ser julgado por homicídio, o leitor decide defender-se a si próprio. Afirma não ser o assassino; o assassino e o leitor são pessoas diferentes. O juiz pede-lhe que apresente provas. Tem fotografias de um intruso com bigode? Não é verdade que as suas impressões digitais correspondem às que foram encontradas na arma do crime? Pode provar que o assassino é esquerdino? "Não", responde o leitor. A sua defesa será muito diferente. Eis as suas alegações finais:
Admito que o assassino é dextro, como eu, que tem as mesmas impressões digitais que as minhas e que não usa barba nem bigode, como eu. Até se parece exactamente comigo nas fotografias da câmara de vigilância apresentadas pela defesa. Não, não tenho um irmão gémeo. Na verdade, admito lembrar-me de ter cometido o homicídio! Mas eu e o homicida não somos a mesma pessoa, uma vez que sofri mudanças. A banda de rock preferida dessa pessoa eram os Led Zeppelin; agora prefiro Todd Rundgren. Essa pessoa tinha apêndice, mas eu não; o meu foi removido na semana passada. Essa pessoa tinha de vinte e cinco anos de idade; eu tenho trinta. Eu e esse assassino de há cinco anos não somos a mesma pessoa. Portanto, não podem punir-me, pois ninguém é culpado de um crime cometido por outra pessoa.
Como é óbvio, nenhum tribunal aceitaria este argumento. No entanto, o que tem de errado? Quando alguém sofre mudanças, física ou psicologicamente, não é verdade que "não é a mesma pessoa"?
Sim, mas a expressão "a mesma pessoa" é ambígua. Há dois sentidos em que podemos afirmar que duas pessoas são a mesma. Quando alguém se converte a uma religião ou rapa o cabelo, torna-se dissemelhante do que era antes. Digamos que, qualitativamente, não é mais a mesma pessoa. Então, em certo sentido, não é "a mesma pessoa". Mas noutro sentido é a mesma pessoa: ninguém o substituiu. Chama-se "identidade numérica" a este segundo género de identidade, uma vez que é o mesmo género de identidade denotado pelo sinal de igualdade em expressões matemáticas como "2 + 2 = 4": as expressões "2 + 2" e "4" representam o mesmo número. Numericamente, o leitor é a mesma pessoa que era em bebé, apesar de qualitativamente ser muito diferente. As alegações finais do julgamento confundem os dois géneros de identidade. Na verdade, o leitor mudou desde que o crime foi cometido: qualitativamente, não é a mesma pessoa. Mas, numericamente, o leitor e o assassino são a mesma pessoa; ninguém mais assassinou a vítima. É verdade que "ninguém pode ser punido pelos crimes de outrem". Mas aqui "outrem" significa alguém que é numericamente distinto do leitor.
O conceito de identidade numérica é importante para os assuntos humanos. Afecta a questão de saber quem podemos punir, uma vez que é injusto punir alguém que seja numericamente distinto do malfeitor. Também desempenha um papel crucial em emoções como a antecipação, o arrependimento e o remorso. O leitor não pode sentir pelos erros dos outros o mesmo género de arrependimento ou de remorso que sente pelos seus próprios erros. Não pode antecipar os prazeres de que outra pessoa terá experiência, por mais que essa pessoa seja semelhante a si em termos qualitativos. A questão sobre o que faz que as pessoas sejam numericamente idênticas ao longo do tempo é conhecida dos filósofos como a questão da identidade pessoal.
Pode-se representar a questão da identidade pessoal através de um exemplo. Imagine o leitor que está muito curioso acerca de como será o futuro. Um dia encontra Deus, particularmente bem-humorada; ela promete ressuscitá-lo quinhentos anos após a sua morte, para que o leitor tenha experiência do futuro. A princípio fica compreensivelmente entusiasmado, mas depois começa a duvidar. Como irá Deus garantir que será o leitor a existir no futuro? Daqui a quinhentos anos terá morrido e o seu corpo ter-se-á decomposto. A matéria que o compõe agora ter-se-á então dispersado pela superfície da terra. Deus poderia facilmente criar, a partir de nova matéria, uma nova pessoa que se assemelhe a si, mas isso não o conforta. O leitor quer ser o próprio a existir no futuro; alguém que seja meramente parecido consigo não serve.
Este exemplo torna o problema da identidade pessoal particularmente vívido, mas repare que a mudança trivial ao longo do tempo levanta as mesmas questões. Olhando para fotografias da infância, você diz "este era eu". Mas porquê? O que faz que o leitor e aquele bebé sejam a mesma pessoa, apesar de todas as mudanças que sofreu ao longo dos anos?
Então, como poderia Deus fazer o leitor existir no futuro? Como vimos, não basta reconstituir, a partir de outra matéria, uma pessoa fisicamente similar. Seria mera semelhança qualitativa. Adiantaria usar a mesma matéria? Deus poderia recolher todos os protões, neutrões e electrões que agora constituem o seu corpo, mas que estarão então dispersos na superfície da Terra, e transformá-los numa pessoa. Por via das dúvidas, Deus poderia até fazer que esta nova pessoa fosse parecida consigo. Mas não seria você. Seria uma nova pessoa criada a partir da sua velha matéria. Se não concorda, então pense no seguinte: esqueça o futuro; tanto quanto sabe, a matéria de que agora é composto o seu corpo foi, em tempos, parte do corpo de outra pessoa, há milhares de anos. É altamente improvável mas contudo possível que a matéria de um antigo estadista grego se tenha reciclado através da biosfera, vindo a acabar em si. É claro que isso não o tornaria numericamente idêntico àquele estadista. O leitor não deveria ser punido pelos crimes do dito; não poderia arrepender-se do que o outro tivesse feito. A identidade da matéria não é condição suficiente para a identidade pessoal.
Tão-pouco é necessária. Pelo menos, a exacta identidade da matéria não é necessária para a identidade pessoal. As pessoas sobrevivem constantemente a mudanças graduais na sua matéria. Ingerem e excretam, cortam o cabelo e perdem porções de pele, e por vezes fazem implantes de pele ou de outra matéria nos seus corpos. Na verdade, o processo normal de ingestão e excreção reciclam quase toda a matéria de que o leitor é feito, periodicamente ao longo dos anos. No entanto, o leitor continua a ser o leitor. A identidade pessoal não está especialmente ligada à identidade da matéria. Então com o que está ela ligada?
|Theodore Sider, http://criticanarede.com/met_idpessoal.html

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Os primatas e a linguagem gestual

Os vídeos estão em Inglês





Será Que um Animal não Humano Pode ser Uma Pessoa?


Parece estranho chamar "pessoa" a um animal. Esta estranheza pode não passar de um sintoma do nosso hábito de manter a nossa espécie claramente separada das restantes. Em todo o caso, podemos evitar a estranheza linguística reformulando a questão de acordo com a nossa definição de "pessoa". O que estamos de facto a indagar é se alguns animais não humanos são seres racionais e autoconscientes, conscientes de si mesmos como entidades distintas com passado e futuro.
Serão os animais autoconscientes? Há hoje provas sólidas de que alguns o são. Talvez a prova mais espetacular provenha dos símios antropóides que conseguem comunicar connosco por meio da linguagem humana. O antigo sonho de ensinar a nossa linguagem a outra espécie tornou-se realidade quando dois cientistas americanos, Allen e Beatrice Gardner, puseram a hipótese de o fracasso das tentativas anteriores para ensinar chimpanzés a falar se tiver devido ao facto de os chimpanzés não possuírem o equipamento vocal necessário para reproduzir os sons da linguagem humana, e não a inteligência necessária para usar a linguagem. Daí que o casal Gardner decidisse tratar um jovem chimpanzé como se fosse um bebé humano sem cordas vocais. Comunicaram com ele e entre si na sua presença usando a linguagem gestual americana, uma linguagem usada correntemente pelos surdos americanos.
A técnica registou um êxito estrondoso. O chimpanzé, ao qual deram o nome de Washoe, aprendeu a compreender cerca de 350 sinais diferentes e a usar correctamente cerca de 150. Alinhava sinais para formar frases simples. Quanto à autoconsciência, Washoe não hesitou quando lhe mostraram a sua imagem num espelho e lhe perguntaram "Quem é?", respondendo "Eu, Washoe". Mais tarde Washoe mudou-se para Ellensburg, no estado de Washington, onde viveu com outros chimpanzés sob os cuidados de Roger e Deborah Fouts. Aí adoptou um chimpanzé bebé e em breve começou não só a fazer-lhe sinais, como a ensinar-lhe deliberadamente esses sinais, moldando as mãos para formar o sinal de "comida" no contexto correto.
Os gorilas parecem ser tão bons como os chimpanzés a aprender a linguagem gestual. Há quase vinte anos, Francine Patterson começou a usar sinais e também a falar inglês com Koko, uma gorila da planície. Koko possui agora um vocabulário prático de mais de 500 sinais e usou cerca de 1000 sinais numa ou mais ocasiões. Compreende um número ainda maior de palavras faladas em inglês. O seu companheiro, Michael, que entrou em contacto com a linguagem gestual numa idade mais tardia, usou cerca de 400 sinais. Em frente de um espelho, Koko faz caretas ou examina os seus dentes. Quando lhe perguntaram "Quem é uma gorila esperta?", Koko respondeu: "Eu" Quando alguém disse de Koko, na sua presença, "Ela é pateta!", Koko (talvez não compreendendo o termo) disse por sinais: "Não, gorila."
Lyn Miles ensinou a linguagem gestual a um orangotango chamado Chantek. Quando lhe mostraram uma fotografia de um gorila a apontar para o nariz, Chantek foi capaz de imitá-lo, apontando também para o seu. Isto implica que possui uma imagem do seu próprio corpo e é capaz de transferir essa imagem do plano bidimensional da imagem visual para realizar a necessária acção corporal.
Os símios antropóides também usam sinais para se referirem a acontecimentos do passado ou do futuro, mostrando assim um sentido do tempo. Koko, por exemplo, quando lhe perguntaram, seis dias após o acontecimento, o que tinha acontecido no seu aniversário, assinalou: "dormir, comer." Mais impressionante ainda é a prova de noção do tempo demonstrada pelas festas regulares realizadas pelo casal Fouts para os seus chimpanzés em Ellensburg. Todos os anos, após o dia da acção de graças, Roger e Deborah Fouts montavam uma árvore de Natal, enfeitada com ornamentos comestíveis. Os chimpanzés usavam a combinação de sinais "árvore doce" para se referirem à árvore de Natal. Em 1989, quando a neve começou a cair logo a seguir ao dia da acção de graças, mas a árvore ainda não fora montada, uma chimpanzé perguntou: "árvore doce?" Os Fouts interpretaram este episódio como prova de que Tatu não apenas se lembrava da árvore, como também sabia que chegara a época do ano em que devia ser montada. Mais tarde, Tatu recordava-se também de que o aniversário de um dos chimpanzés, Dhar, tinha lugar pouco depois do de Deborah Fouts. Os chimpanzés recebiam gelados no seu dia de anos e, quando terminou a festa de aniversário de Deborah, Tatu perguntou: "Dhar, gelado?"
Suponhamos que, com base nestes elementos, aceitamos que os símios que usam sinais são autoconscientes. Serão excepcionais, a este respeito, entre todos os animais não humanos precisamente porque usam uma linguagem? Ou será que a linguagem permite meramente que estes animais nos demonstrem uma característica que tanto eles como os outros animais possuem?
Alguns filósofos têm defendido que o pensamento requer a linguagem: não se pode pensar sem se formular os pensamentos em palavras. O filósofo Stuart Hampshire, de Oxford, por exemplo, escreveu:

“Neste caso, a diferença entre um ser humano e um animal reside na possibilidade de o ser humano exprimir e pôr em palavras a sua intenção de fazer isto ou aquilo, para seu benefício ou benefício dos outros. A diferença não é meramente a de que um animal não tem, de facto, qualquer meio de comunicar ou de registar para si mesmo as suas intenções, pelo que ninguém pode alguma vez saber qual era a sua intenção. É uma diferença mais forte, que se exprime corretamente como o absurdo de atribuir intenções a um animal que não tem meios de reflectir sobre o seu próprio comportamento futuro nem de anunciá-lo a si nem aos outros [...] Seria absurdo atribuir a um animal uma memória que distinguisse a ordem de acontecimentos no passado e sê-lo-ia também atribuir-lhe a expectativa de uma ordem de acontecimentos no futuro. O animal não possui os conceitos de ordem, nem quaisquer outros conceitos.”

É óbvio que Hampshire estava enganado na sua distinção tão drástica entre seres humanos e animais; como acabamos de ver, os símios antropóides que comunicam por sinais mostraram claramente que possuem, de facto, "uma expectativa de uma ordem de acontecimentos no futuro". Mas Hampshire escreveu aquelas linhas antes de os símios terem aprendido a usar a linguagem gestual, de modo que este lapso é perdoável. O mesmo não se pode dizer da defesa muito posterior da mesma perspectiva por outro filósofo inglês, Michael Leahy, num livro intitulado Against Liberation. Como Hampshire, Leahy defende que os animais desprovidos de linguagem não podem ter intenções nem agir "com base em razões".
Suponhamos que reformulávamos tais argumentos de modo que se referissem aos animais que não aprenderam a usar uma linguagem, e não a todos os animais. Teriam nesse caso razão? Se assim fosse, nenhum ser sem uma linguagem se poderia considerar uma pessoa. Isto aplica-se, presumivelmente, tanto aos bebés humanos como aos animais sem a linguagem gestual. Pode argumentar-se que muitas espécies de animais usam de facto uma linguagem, que simplesmente é diferente da nossa. Não há dúvida de que a maioria dos animais sociais possui certos meios de comunicarem uns com outros, quer sejam as canções melodiosas das baleias-de-dorso-cinzento, os zumbidos e assobios dos golfinhos, os uivos e latidos dos cães, os trinados das aves ou até a dança realizada pelas abelhas quando regressam à colmeia, que transmite às outras a distância e a direcção da fonte de alimentos de onde aquelas regressaram. Mas é duvidoso que essas expressões sejam equivalentes a uma linguagem no sentido requerido, porque ao falarmos em linguagem estamos a referir-nos a um sistema simbólico; e, como nos afastaríamos demasiado do nosso tema se explorasse essa questão partirá do princípio de que não o são e terei em consideração o que podemos saber a partir do comportamento não linguístico dos animais.
Será sólida a linha de argumentação que nega um comportamento intencional a animais quando se limita a animais sem linguagem? Creio que não. Os argumentos de Hampshire e de Leahy são típicos de muitos filósofos que já escreveram coisas semelhantes no facto de não passarem de tentativas de fazer filosofia de sofá sobre um tema que exige investigação no mundo real. Não há nada de inteiramente inconcebível em relação a um ser que possua a capacidade de pensamento conceptual sem possuir uma linguagem e há exemplos de comportamento animal que são muito difíceis, se não impossíveis, de explicar, a não ser que se pressuponha que os animais pensam conceptualmente. Por exemplo, numa dada experiência, investigadores alemães apresentaram a uma chimpanzé chamada Júlia duas séries de cinco caixas fechadas e transparentes. No final de uma série estava uma caixa contendo uma banana; a caixa no final da outra série estava vazia. Só se podia abrir a caixa que continha a banana com uma chave de um formato distinto, o que era evidente olhando para a caixa. Esta chave podia ver-se no interior de outra caixa fechada; e, para abrir essa caixa, Júlia necessitava de outra chave diferente, que tinha de ser retirada de uma terceira caixa, que só podia abrir-se com a sua própria chave, que, por sua vez, estava dentro de uma quarta caixa fechada. Por fim, em frente de Júlia estavam duas caixas iniciais, abertas, contendo cada uma delas uma chave diferente. Júlia conseguiu escolher a chave inicial correta, com a qual abriu a caixa seguinte da série, que acabou por levá-la à caixa contendo a banana. Para fazê-lo teve de ser capaz de raciocinar retrospectivamente, desde o seu desejo de abrir a caixa com a banana até ao facto de precisar de ter a chave para abri-la, daqui para o facto de precisar da chave que abriria essa outra caixa e assim sucessivamente. Como não ensinaram a *Júlia* nenhum tipo de linguagem, o seu comportamento prova que seres sem linguagem podem pensar de forma bastante complexa.
Não é apenas em experiências de laboratório que o comportamento de animais aponta para a conclusão de que possuem tanto memória do passado como expectativas acerca do futuro e que são autoconscientes, formando intenções e agindo a partir delas. Frans de Waal e os seus colegas observaram durante anos chimpanzés vivendo em condições seminaturais em 8000 metros quadrados do Jardim Zoológico de Amsterdão. Observaram muitas vezes actividades de cooperação que exigem planeamento. Por exemplo, os chimpanzés gostam de trepar nas árvores e de partir ramos para comerem as folhas. Para evitar a rápida destruição do pequeno bosque, os tratadores do jardim zoológico colocaram uma cerca eléctrica em volta do tronco das árvores. Os chimpanzés deram a volta a esta dificuldade partindo grandes ramos de árvores mortas (que não tinham cercas em seu redor) e arrastando-os até à base das árvores vivas. Um chimpanzé segurava então o ramo morto enquanto outro trepava por ele, passando por cima da cerca e chegando à árvore. O chimpanzé que chegava à árvore por este processo dividia as folhas que obtinha com aquele que segurava o galho.
/.../
Jane Goodall descreveu um incidente que mostra planificação com respeito ao futuro por parte de Figan, um jovem chimpanzé selvagem da região de Gombe, na Tanzânia. Para atrair os animais para mais perto do seu lugar de observação, Goodall escondeu algumas bananas numa árvore:
Certo dia, algum tempo depois de o grupo ter comido, Figan vislumbrou uma banana que tinha passado despercebida -- mas Golias [um macho adulto com uma posição superior a Figan na hierarquia do grupo] estava a descansar mesmo por baixo da banana. Após um movimento rápido do olhar, do fruto para Golias, Figan afastou-se e sentou-se no outro lado do acampamento, de modo que deixou de poder ver o fruto. Um quarto de hora depois, quando Golias se levantou e se afastou, Figan, sem a menor hesitação, foi lá e apanhou a banana. Não há dúvida de que tinha avaliado toda a situação: se tivesse tentado apanhar o fruto antes, Golias quase de certeza lhe arrebataria a banana. Se tivesse ficado perto da banana, provavelmente teria olhado para ela de vez em quando. Os chimpanzés são muito lentos a ver e a interpretar os movimentos dos olhos dos seus companheiros, e, portanto Golias teria possivelmente avistado o fruto. De modo que Figan não só conteve a satisfação imediata do seu desejo, como se afastou de modo a não "abrir o jogo" olhando para a banana.
A descrição deste episódio apresentada por Goodall atribui a Figan um conjunto complexo de intenções, incluindo a intenção de evitar "abrir o jogo" e a de apanhar a banana após o afastamento de Golias. Também atribui a Figan uma "expectativa de uma ordem de acontecimentos no futuro", nomeadamente a expectativa de Golias se afastar, de a banana permanecer ali e de ele, Figan, ir lá apanhá-la. E, no entanto, não parece haver nada de "absurdo" nestas atribuições, apesar do fato de Figan não poder transmitir as suas intenções ou expectativas por palavras. Se um animal pode conceber um plano meticuloso para apanhar uma banana, não no momento imediato, mas num momento posterior do tempo, e tomar precauções contra a sua própria propensão para revelar o objectivo do plano, esse animal deve ter consciência de si próprio como uma entidade distinta existindo ao longo do tempo.
http://liberdadeazulsp.blogspot.pt/2013/07/sera-que-um-animal-nao-humano-pode-ser.html
por Raffaell Garone
Consultado no dia 01/09/2013


Os golfinhos são "pessoas não humanas"


Não só os primatas. Os golfinhos e as baleias também devem ser tratados como “pessoas não humanas”, com direito à vida e à liberdade, segundo propõem prestigiados cientistas reunidos na conferência anual da Associação Americana para o Avanço da Ciência, a maior do mundo, que se realiza em Vancouver, no Canadá.
Peritos em conservação e comportamento dos animais consideram que estes cetáceos são suficientemente inteligentes para que recebam as mesmas considerações éticas que os seres humanos, de acordo com o jornal espanhol ABC. Isto implica colocar um fim à sua casa, ao cativeiro e abusos.
Por este motivo, apoiam a criação de uma Declaração dos Direitos dos Cetáceos.
“A ciência tem demonstrado que a individualidade – a consciência de si próprio – não é uma característica única do ser humano. Isto levanta uma série de desafios”, disse, à BBC, Tom White, professor de ética na Universidade Loyola Marymount, em Los Angeles, nos Estados Unidos.
Os investigadores que estão de acordo com esta corrente de pensamento concluem que, embora não sejam seres humanos, os delfins e as baleias são “pessoas” no sentido filosófico, o que tem importantes implicações.
A declaração, primeiro aprovada em Maio de 2010, assinala que os cetáceos têm direito à vida, não podem ser obrigados a estar em cativeiro nem a ser objecto de maus tratos, nem a serem retirados do seu ambiente natural.
Da mesma forma, não podem ser propriedade de ninguém. A base de todos é que os golfinhos têm consciência de si mesmos, reconhecem a sua imagem ao espelho. Sabem quem são.
http://www.jn.pt/blogs/osbichos/archive/2012/02/25/os-golfinhos-s-227-o-quot-pessoas-n-227-o-humanas-quot.aspx
Fátima Mariano
Consultado no dia 01/09/2013

Índia declara golfinhos “pessoas não-humanas”
O ministro do Ambiente da Índia declarou que os golfinhos devem ser vistos como “pessoas não-humanas” e proibiu que estes sejam mantidos em cativeiro ou usados em espectáculos de entretenimento.
O político justificou a decisão com o facto de as investigações científicas mostrarem que os golfinhos possuem um nível de inteligência superior à de outros animais.
“Muitos cientistas que pesquisaram o comportamento dos golfinhos acreditam que eles possuem um nível de inteligência invulgarmente alto”, afirmou o ministro.
Para o responsável pela pasta do Ambiente na Índia, “comparativamente aos restantes animais, os golfinhos deviam ser vistos como ‘pessoas não-humanas’ e, como tal, ter os seus próprios direitos, por isso é moralmente inaceitável mantê-los em cativeiro com objectivos de entretenimento”.

http://www.ionline.pt/artigos/mundo-iciencia/india-declara-golfinhos-pessoas-nao-humanas
Por Ana Tomás
publicado em 2 Ago 2013

A evolução da espécie humana

sábado, 7 de setembro de 2013

O que nos torna humanos?






Desde que o naturalista inglês Charles Darwin propôs, em 1860, a sua famosa teoria da selecção natural, não temos mais dúvidas de que a espécie humana moderna, o Homo sapiens sapiens, evoluiu a partir de outras espécies, num contínuo que remete para um primata que foi, algum dia no passado distante, o "elo perdido" entre os primatas antropóides ("parecidos com o homem"), e o primeiro dos hominídeos ("género dos homens"). Ao longo do século XX, inúmeras descobertas paleoantropológicas demonstraram a existência de um grande número de espécies de hominídeos, como o Australopithecus, todas elas surgidas em África, num período que cobre os últimos 5,5 milhões de anos. O crescimento gradativo da capacidade craniana e do volume do cérebro, o aparecimento da postura erecta permanente, com a libertação da mão, o surgimento do uso de ferramentas e da cultura simbólica, o domínio de tecnologias como o fogo e a construção de abrigos, a caça, etc., tudo isso é bastante evidente a partir do exame do registo arqueológico dos hominídeos, até ao surgimento, 2 milhões de anos atrás, do Homo habilis ("homem habilidoso") e do Homo erectus ("homem erecto"), as primeiras espécies que talvez possamos considerar "humanas", no seu sentido moderno, pois desenvolveram a linguagem falada complexa, a construção de ferramentas, as vestimentas, o fogo, a cocção dos alimentos, etc. A capacidade craniana aumentou de 500 cm3 para 1200 cm3 entre os primeiros Homo habilis e o Homo erectus, em pouco mais de um milhão de anos, embora a sua aparência facial continuasse a ser a de um antropóide. Foi, também, a primeira espécie humana a ter mobilidade em escala planetária, tendo-se espalhado pelo Médio Oriente, China e Java. Os seus sucessores, o Homosapiens neandertalensis, surgido há 300 mil anos atrás, e o Homosapiens sapiens, há 120 mil anos, aumentaram a capacidade craniana para o valor actual (1350 cm3), invadiram todos os rincões da Terra, mesmo os mais distantes e inóspitos, desenvolveram as representações simbólicas, como a arte pictórica, a escultura e a música, os adornos corporais, as armas de guerra, a medicina, a domesticação de animais, a agricultura, e as crenças espirituais, como as religiões, o culto ao invisível, os ritos funerários e as superstições mágicas. Todas essas características e "invenções" eram unicamente culturais e transmissíveis entre seres humanos através do ensino, e são únicas entre as espécies animais, inclusive entre os outros primatas.
Não é muito difícil chegar à conclusão de que somos realmente muito parecidos biologicamente com os nossos "primos", os grandes primatas antropóides. Nos tempos de Darwin, um dos eventos que mais influenciou a aceitação da sua teoria foi a exposição, pela primeira vez, de gorilas vivos no Jardim Zoológico de Londres. As muitas coisas que temos em comum com eles abalou as convicções profundas dos vitorianos da época, que defendiam que o ser humano tinha sido criado por Deus à sua imagem, como uma espécie totalmente à parte das demais. Por exemplo, herdámos dos primatas e antropóides algumas características fundamentais tais como a visão colorida, os dois olhos voltados para a frente, a face plana, o grande desenvolvimento do neocórtex, e a alta destreza manual, esta última incomparável a de qualquer outro mamífero. Comportamentalmente, todos os antropóides são capazes de manipular símbolos, demonstram uma enorme capacidade de adaptação ao ambiente através da aprendizagem, são capazes de usar ferramentas para uma variedade de tarefas, utilizam muito os tele-sentidos (visão e audição) para interagir com o ambiente, possuem transmissão cultural do conhecimento, têm uma bem estruturada vida social baseada na tribo, o comportamento sexual e reprodutivo, e complexas formas de intercomunicação intra-específica. Geneticamente também somos muito parecidos: a biologia molecular descobriu, por exemplo, que  98% do genoma do chimpanzé é igual ao nosso. Em suma, somos "macacos sem pêlos", como dizia o título de um livro que fez grande sucesso na década dos 70s, "The Naked Ape", do biólogo inglês Desmond Morris. Comparativamente a outros mamíferos superiores, somos extremamente desprotegidos. Não possuímos garras nem presas proeminentes, não temos pele grossa, temos poucos pêlos. Temos limitações em correr, saltar, nadar.
Então, como esse animal singularmente frágil conseguiu espalhar-se por todo o planeta, sobreviver nas condições mais extremas e ser capaz de dominar todos os tipos de ambiente, até mesmo o espaço sideral?  O que nos distingue das outras criaturas vivas? O que nos faz unicamente humanos? Esta tem sido uma indagação angustiada desde que Darwin nos "tirou" o estatuto de espécie dominante do universo...
De facto, o homem possui diversos atributos que o distinguem das outras espécies. A postura erecta e andar com os membros inferiores permitiu aos membros superiores ficarem livres para outras funções; a mão preênsil  atua como uma verdadeira ferramenta e permite o desenvolvimento da tecnologia; o desenvolvimento da fala e da linguagem permitiu formas de comunicação mais adaptáveis; o alargamento do cérebro relativo ao tamanho do corpo; o desenvolvimento das interações sociais e culturais: infância e juventude prolongada, desta forma oferecendo a base para a complexa organização social, bem como a divisão de tarefas na sociedade, controlo sobre o sexo e a agressão. Finalmente, os seres humanos expressam-se como indivíduos. As características que permitem isto incluem a emoção, a motivação, a expressão artística e espiritual.
Todas essas características, direta ou indiretamente  relacionam-se com o desenvolvimento do nosso cérebro. O nosso carácter único repousa no nosso cérebro. O enorme cérebro desenvolvido principalmente no córtex cerebral dotou-nos de propriedades que não existem, ou existem de forma primitiva noutros antropoides  É no córtex que possuímos os mais altos níveis de análise sintética. É lá que a nossa visão do mundo é analisada, planeada e programada para executarmos uma ação.
O grande desenvolvimento do cérebro, por sua vez, levou ao nascimento daquilo que o cognitivista americano Steven Pinker denominou de "uma espécie simbólica". Desenvolvemos, através de símbolos verbais, a representação de objetos da realidade e conceitos abstratos.  Além da capacidade verbal do cérebro, desenvolvemos a capacidade de emitir sons de alta precisão que manipulados por este cérebro simbólico possibilitou, pela primeira vez na escala animal, a evolução extra genéticaa evolução cultural, ou seja, a transmissão de símbolos de um ser humano para outro. Com isso desenvolveu-se o conhecimento, que é uma propriedade única do ser humano, e que se relaciona com o pensamento e a consciência (que certamente podem existir em outros primatas não humanos, mas que diferem num grau muito amplo em relação à espécie humana).
A capacidade simbólica do cérebro gerou coisas notáveis como uma habilidade geneticamente determinada de aprender qualquer língua ou inventar uma nova, por exemplo, o esperanto e as linguagens de computador. Também gerou a capacidade especial de inventar melodias, sons harmónicos, dança, elementos simbólicos que usam provavelmente as nossas estruturas cerebrais responsáveis pela fala, articulação dos movimentos e pela integração de tudo isso.
Entre as nossas características culturais únicas, a arte é talvez a mais nobre invenção humana. Imaginem, por exemplo, a necessidade de recrutamento de biliões de neurónicos, milhares de músculos, uma imensa capacidade sensorial, visual e auditiva, a espantosa capacidade de memória envolvida para saber de cor e executar um concerto para tocar uma serenata de Chopin ao piano.  São biliões e biliões de neurónios, treinados ao longo de anos de prática, espalhados por todas as regiões do cérebro, e trabalhando em harmonia para produzir um resultado de uma complexidade inimaginável.
Quando o homem se tornou um animal tribal, desde que começou a andar erecto, mais de 4 milhões de anos atrás, ele passou a ser um caçador e guerreiro tribal, onde a cooperação social era um fator importante de sobrevivência. Todos os instintos sociais humanos se desenvolveram bem antes da esfera intelectual: instinto maternal, cooperação, curiosidade, criatividade, compaixão, altruísmo, competitividade, etc., são muito antigos, e podem ser vistos nos antropoides  também. Mas, o ser humano novamente se distingue dos outros primatas através de uma característica mental muito forte: gradativamente desenvolvemos o auto-controlo, ou seja, a capacidade de modificarmos qualquer comportamento social, mesmo que instintivo, de maneira a torná-lo mais útil para a nossa sobrevivência. Quanto mais disciplinados, e capazes de auto-controlo e de planeamento, quanto mais a nossa mente racional for capaz de dominar a emocional e instintiva, mais humanos seremos.
Portanto, a espécie humana também tem o singular dom de dominar o cérebro emocional por meio do cérebro racional. Isto, adicionado à capacidade de planear, gerou um animal capaz de vencer através da inteligência todas as suas restrições e debilidades físicas, tomando-se a espécie dominante do planeta, destruindo e devassando aquelas que se lhe opõem, ou usando para si aquelas espécies que são úteis para o seu próprio benefício como as bestas de carga, as cobaias de laboratório, os animais produzidos para alimento, etc.
O que nos aguarda no futuro? Como será a espécie humana no ambiente que aprendemos a moldar e reconstruir?
Ainda é cedo para respondermos. Precisamos, sem dúvida, de nos entendermos melhor. Existem motivos para duvidar que nos próximos 50 anos sejamos capazes de deslindar o funcionamento das funções intelectuais superiores, devido à enorme complexidade do sistema nervoso, para a qual ainda não existem métodos adequados de estudo.  Muitos filósofos colocam inclusive a dúvida de se um cérebro é capaz de entender-se a si mesmo algum dia. Talvez a complexidade estrutural e funcional do nosso cérebro seja tão grande, que nunca possamos chegar a entendê-la: seria necessário ter um cérebro mais desenvolvido para isso.
CarlSagan, Os Dragões do Éden.
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ANÁLISE/EXPLORAÇÃO DO TEXTO

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Mapa conceptual interpretativo do documentário





Pessoa

Rene MagritteL'ami de l'ordre (1964)

PESSOA
nome feminino
1. Ser humano considerado na sua individualidade física e espiritual.
2. GRAMÁTICA - categoria morfossintática que indica a relação de quem fala com o(s) participante(s) do facto narrado (locutor ou 1.ª pessoa, interlocutor ou 2.ª pessoa, ou aquele que é referido ou 3.ª pessoa).
3. DIREITO - sujeito de direito; indivíduo na sua existência civil.
4. PSICOLOGIA - ser humano enquanto aberto aos seus semelhantes, integrado numa comunidade e orientado para um ideal (por oposição a indivíduo).
5. FILOSOFIA - Na filosofia, uma pessoa é uma entidade que tem certas capacidades ou atributos associados a personalidade, por exemplo, em um contexto particular moral, social ou institucional. Essas capacidades ou atributos podem incluir a auto-consciência, a noção de passado e futuro, e a posse de capacidade ética , entre outros. Também, filosoficamente, uma pessoa é o ser humano como agente moral. É aquele que realiza uma acção moral e aquele que ajuíza sobre ela.

Na linguagem do dia-a-dia, a palavra pessoa refere-se a um ser racional e consciente de si mesmo, com identidade própria. O exemplo exclusivo costuma ser o próprio ser humano embora haja quem estenda o conceito para outras espécies (conceito de pessoa não-humana).
Uma pessoa é um ser social dotado de sensibilidade, com inteligência e vontade propriamente humanas. Para a psicologia, trata-se de um indivíduo humano concreto (o conceito abarca os aspectos físicos e psíquicos do sujeito que o definem pelo seu carácter singular e único).

quinta-feira, 5 de setembro de 2013

Uma Parábola


"Eu mendigava de porta em porta, pelo caminho da aldeia, quando um carro de ouro surgiu à distância e parecia um sonho esplêndido. 
Perguntei a mim mesmo quem seria esse Rei de todos os reis. As minhas esperanças subiram ao céu. Eu pensava: terminaram os meus dias nefastos. E tive esperança de esmolas espontâneas e de riquezas soltas na areia. 
O carro parou onde eu estava. Ele  olhou-me e sorriu. Eu senti que afinal chegara o dia da minha felicidade. E de repente estendeu-me a mão direita, perguntando: "Que tens para mim?" 
Ah, o teu gesto real de estender a mão direita a um mendigo! Confuso, perplexo, meti a mão na sacola e, devagar, retirei um pequeno grão de trigo, que lhe ofereci. 
Mas, à tardinha, foi enorme a minha surpresa. Esvaziando a minha sacola, vi um grão de ouro entre os de trigo. Chorei lágrimas amargas e lamentando-me dizia: "Por que não lhe dei tudo?"
|Rabindranath Tagore


Trabalho de grupo sobre a Arte

O que é a arte by paulofeitais on Scribd                            Teorias estéticas from Paulo Gomes Trabalho de grupo:...